Há uma série de distúrbios de personalidade ou sintomas compulsivos no campo do consumo. Modos inconscientes de descontrole emocional aparecem sob a forma distorcida do consumismo viciante.
Na arena dos produtos de luxo, isso é muito comum, já que o valor central destes bens residem nos seus benefícios psíquicos e emocionais. A desenfreada paixão e o desejo compulsivo pela aquisição de objetos caros e exclusivos, comprados em série e muitas vezes nunca consumido, reforça a fragilidade psíquica e impulsiona uma espécie de ansiedade patológica. Nestes casos, buscando pistas psicanalíticas para compreender o fenômeno, poderíamos inferir que a atenção amorosa é maior em relação aos objetos e coisas que à pessoas e relações humanas. Esta compulsão demonstra, talvez, uma dependência inconsciente de atenção e uma forte expressão de defesa contra a incapacidade de sentir ou de expressar o que se sente.
Nas ce daí, uma espécie de 'compensação de urgência', sem a qual, a consumidora entraria em em estado de angústia ou uma tensão pronunciada, decorrente de um acúmulo de ansiedade. Em termos almodovarianos, consumidoras compulsivas à beira de um ataque de nervos!
Casos clínicos mostram um número expressivo de mulheres, que depois de terminarem um relacionamento, se divorciarem ou se verem 'sozinhas', the day after, um caso amoroso decidem sair as compras e gastar de forma abusiva e 'impensada', agindo mais por impulsos primários de conservação que por necessidade prática. Neste caso inverte-se a pirâmide de Maslow, e a sensação de segurança e afeto se tornam mais importantes que os impulsos naturais de fome e sede. O consumo parece ser, neste caso, o caminho mais rápido e menos doloroso para se atingir a felicidade ou a intensificação da vida. Qualquer tristeza mínima parece acelerar o mecanismo vicioso do looping "cartão de crédito-shopping center-compras etiquetas e sacolas". Decreta-se que o consumo é uma espécie de terapia eficaz que alivia tensões, aumenta o coeficiente da auto-estima e injeta bom humor e serotonina na corrente sanguínea. Consumo como sinônimo de felicidade e bem estar.
Esta lógica moderna é facilmente encontrável. No mercado das indulgências e das experiências de consumo de luxo e acesso, não só mulheres, mas homens também, embarcam alucinadamente na fantasmagórica montanha russa das compras. Vou ao shopping, vou ao paraíso e retorno ao útero pacificado. Como se produtos e marcas carregassem resíduos simbólicos de um mundo de afeto e completude perdido, como se preenchessem uma falta ou falha aberta e nos tornassem mais poderosos e amados.
As compulsões nascem nestas brechas de carência, destas ansiedades não dominadas e são sistemas de defesa desenvolvidos pelos indivíduos para anestesiarem-se da realidade. Segundo Freud, as pessoas podem exibir fixações ou obsessões dos mais diversos tipos. O consumismo é apenas um dos vícios de uma lista farta e variada. Ele funciona como válvula de escape e permite que exibamos ou realizemos um sentimento que, em verdade, precisamos frear ou inibir: uma formação substituta, diria a psicanálise. Estabelemos uma "relação básica" de confiança e afeto, diria Winnicott, com os objetos. Uma relação amorosa de dependência inconsciente ou um jogo de tranferência libidinal. O comsumo compulsivo é um consumo emocional, mas de uma emoção 'perversa', marcada pelo descontrole e ansiedade.
O mercado sabe disso, e explora em forma de satisfações momentâneas, a carência existencial do próprio homem. Cria uma ciranda de motivações e estímulos contínuos e reativa, excita e enche de ansiedade, atodo instante, o nosso estranho princípio do desejo.
Será que o projeto do eu narcísico, do consumidor inveterado e compulsivo é um projeto baseado na aquisição crescente de bens e pela perseguição cega do status? Que carga afetiva, emocional e psíquica carregam os bens exclusivos e de exceção?
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