Novo espaço para se pensar e discutir a dinâmica do mercado e das marcas de luxo, dos produtos e serviços com alto valor agregado e para todos aqueles que se interessam pelos temas do consumo e novas tendências, moda e estilo, design, branding e marketing. O crescimento e a valorização do luxo é uma questão central do consumo contemporâneo e faltam especialistas e espaços para discutir este tema com seriedade.

Tuesday, July 22, 2008



Os Rituais do Consumo do Luxo
A abundância de bens de valor e riquezas não significava em si poder, nem significava a necessidade de acúmulo ou prestígio em si mesmo. O prestígio estava não no acúmulo ou posse de bens superiores, mas no esbanjamento, em poder patrocinar grandes festas, presentear ou retribuir de forma pródiga ou consumir ostentatoriamente. Esta era o caráter do luxo-dom, bem diferente do conceito de luxo que temos hoje.
O consumo 'ostentatório' destes bens criava elos de ligação entre os homens, garantia prestígio e honras aos chefes e funcionava como um elo religioso e mítico do homem com o cosmos e suas divindades. Este princípio de troca e gratificação mútua era um fluxo contrário à acumulação de riquezas nas mãos de alguns poucos. O Kula tinha concepções míticas: os bens mais preciosos não são jamais considerados bens econômicos ou fontes per se de acumulação e poder. Eles têm um nome e são reconhecidos por seu valor sagrado. Dar aos espíritos e aos mortos ofertas de libação para que eles se mostrem protetores e generosos, esta era a base do principio da reciprocidade. Nas festas religiosas se consumia em excesso e este consumo festivo aparecia como recriação do caos primitivo e fonte de vida.
“A troca de presentes produz abundâncias de riquezas”, dizia Mauss no seu ensaio sobre a dádiva. O luxo e fastio das festas estavam ligados à idéia de expurgação, aos aspectos lúdicos e sagrados, ao comprometimento com os mortos e com a celebração da vida farta. Dar significava dissipar as riquezas nas festas, para que a ordem do mundo que o origina se regenerasse, e a aliança entre vivos e mortos se restabelecesse e não cessasse jamais. Crenças espirituais profundas e raízes míticas fundadas no sentimento religioso, estão na origem das condições de emergência do luxo primitivo.
Esta lógica da reciprocidade era horizontal, baseava-se na relação terrena entre os homens ofertando bens ou trocando entre si segundo sentimentos ou crenças míticas e na generosidade com os mortos. Logo depois, se seguiu uma época onde a ordem do mundo se tornou mais hierárquica: os homens ofertavam suas posse e bens de valor as divindades transcendentes e mágicas.
Os bens de prestígio eram oferecidos a estes deuses para garantir benesses, fartura e prosperidade material para seu povo.
Quando os próprios homens começaram a afirmar serem eles mesmos encarnações ou serem eles, os mandatários do poder divino destes deuses na terra, uma nova ordem social e política nascia e se recriava uma lógica vertical e hierárquica entre os homens.
O luxo na mão de poucos se tornava legítimo, porque estes algozes representavam o próprio poder sagrado sobre a terra. Este momento é concomitante ao surgimento do Estado e marca a aparição da sociedade política dividida em estamentos ou classes. Este momento constitui uma das maiores rupturas na história do luxo: a separação entre nobres e plebeus, base e vértice da pirâmide. A riqueza e o luxo se concentravam em poucas mãos e sua posse era indicativa do poder de alguns homens sobre uma grande maioria. A nova lógica legitimava a acumulação centralizada e a hierarquização.

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