Novo espaço para se pensar e discutir a dinâmica do mercado e das marcas de luxo, dos produtos e serviços com alto valor agregado e para todos aqueles que se interessam pelos temas do consumo e novas tendências, moda e estilo, design, branding e marketing. O crescimento e a valorização do luxo é uma questão central do consumo contemporâneo e faltam especialistas e espaços para discutir este tema com seriedade.

Thursday, July 20, 2006


O Design e o Merchandising antecederam a Publicidade

Era uma vez no século xix... e a Bon Marché, primeira grande loja de departamentos da 'cidade luz' Paris era inaugurada por volta de 1865. Um projeto de dois grandes arquitetos da época, Eiffel e Boileau, uma nova loja de 53 mil m2 que ocupava um quarteirão inteiro à margem esquerda do Rio Sena.
Poderíamos começar falando da famosa Harrods em Londres também. Templo do consumo na meca do industrialismo do século. Suas portas foram abertas antes, em 1849, mas era ainda um pequeno ponto de varejo que era inaugurado no novo bairro de Knightsbridge e só iria se tornar uma grande loja de departamentos 25 anos depois, poucos anos antes de um incêndio que quase riscou a Harrod´s do mapa londrino.
Mas ela sobreviveu e prosperou e ainda é o grande nome do varejo Londrino ao lado da Selfridge´s e outras mais. Mas voltemos ao século xix e vamos viajar no túbel do tempo.
Os grandes pioneiros do grande varejo moderno foram outros nomes menos conhecidos, pois estavam fora do eixo da moda Paris-Londres. As duas primeiras e maiores nasceram no norte da Inglaterra, mais industrializado e urbano no ínicio do século xix. Em Newcastle abria a Bainbridge, e em Manchester a Kendal, Milne and Faulkner. Isso foi entre as décadas de 30 e 40 daquele século, mais ou menos 170 anos atrás, mas é um case e tanto de marketing de varejo.
A Inglaterra criou o grande varejo moderno, o preço fixo, as grandes vitrines e o layout da divisão por seções e segmentos de produtos. Fez as primeiras revoluções burguesas, era a principal economia mundial da época, criou a indústria, desenvolveu o varejo moderno, criou as linhas de crédito para o consumo e foi a sede da primeira das Grandes Exposições Universais em 1851 no Palácio de Cristal.
Mas foram as lojas de departamento da Inglaterra e da França que criaram algo novo e surpreendente pra época: as grandes vitrines com suas decorações e arte. Quebravam-se as espessas paredes de concreto e instalavam ali um material moderno, lustroso e transparente: o vidro. As vitrines se tornavam a versão moderna dos altares e espelhos: vazavam, refletiam, guardavam e expunham os novos objetos de desejo do consumo moderno. Os transeuntes faziam o que se chamava de 'windowshopping'. Do lado de fora observavam as novidades e promoções, 'looking but not touching'. Dentro do imenso box de vidro das fachadas, isolavam-se os objetos industriais, que flertavam e lançavam olhares amorosos, em busca de seduzir seus novos admiradores. Mercadorias estetizadas, com rótulos de procedência, nomes pessoalizados e embalagens atraentes. Dentro, novas coisas, materiais, formas, cores, motivos e funcionalidades. Do lado de fora, novas necessidades, aspirações, suspiros e desejos.
O design se antecipava a publicidade como forma de comunicação persuasiva e as mercadorias sofisticadas dos 'Grands Magasins' alucinavam os consumidores sobre os pedestais de seus displays ou sobre os finos balcões envernizados, fazendo apelos sensuais, convites ao sonho e promessas de felicidade. Tais como as prostitutas de luxo que em troca do dinheiro do cliente acenavam e prometiam a realização de seus desejos, os novos produtos ficavam ali nas vitrines e displays, sobre os balcões ou protegidos por vidros em lugares estratégicos, envoltos em cetim ou veludo e cobertos de 'verniz'. Coisas novas, belas e assépticas.
As primeiras vitrines de sucesso foram aquelas preparadas para o Natal. Aglomeravam-se milhares de pessoas a noite para ver as grandes obras de arte e os enfeites das lojas. Um espetáculo para ricos e pobres.
Outras foram criadas para ser uma miragem das ilhas dos mares do sul: areia, palmeiras estilizadas, uma luz direta remetendo ao calor do sol e muitas panelas, porcelanas e talheres, objetos finos para a classe média urbana ascendente. As novas utilidades domésticas da época eram o 'narcótico' das classes emergentes e afluentes. Milhares de pessoas diariamente se prostravam frente as vitrines, contemplando em silêncio e isolamento as novas formas utilitárias. Esta utilização de vitrines, displays e a busca por uma identidade e uma estetização da mercadoria antecederam as técnicas de informação e persuasão publicitária. Não só certos produtos se tornavam mais acessíveis e funcionais como pesquisas de novos materiais e e novos usos surgiam. Vide as Exposições Universais.
Há uma passagem interessante de Tempos Modernos, não sei se vocês se lembram, que não se passa na fábrica, mas sim no interior de uma grande loja de departamentos, onde Chaplin e sua namorada resolvem ir passear e se deslumbram e se apaixonam pelos novos objetos, e produtos da indústria. Sua namorada adormece na enorme cama de lençõis de cetim enquanto Chaplin descobre as peripécias e prazeres das novas invenções.
Em Paris surgiam os Grands Magasins e a cidade roubava para si o título de cidade do varejo de luxo. Com a industrialização e o crescimento do comércio, muitos produtos inacessíveis as 'classes médias' e a pequena burguesia agora se tornavam menos proibitivos e muitos deles se democratizavam. Era o primeiro grande ciclo da democratização do luxo.

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